sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Defesa prática do cristianismo integral

O cristão deve harmonizar os vários aspectos de sua vida intelectual a fim de se tornar uma pessoa integral, não-fragmentada. Estamos escrevendo sobre isso desde o inicio desse blog.

No entanto, algumas objeções tem sido feitas por ateus, cristãos e outros. Alguns sugerem que a pessoa não deve misturar suas convicções religiosas com suas convicções acadêmicas. Outros sugerem que a ciência é o padrão pelo qual se julga a teologia e a filosofia, e que a religião fica livre para “pensar” apenas nas áreas onde a ciência ainda não tem nada a dizer.

Não vamos aqui analisar e refutar cada objeção levantada. Mantemos nossa posição a favor da coerência: não se pode acreditar numa coisa na igreja e em outra na sala de aula, no escritório ou no consultório.

Um leitor sugere a “suspensão do juízo como heurística”, o que parece uma boa idéia pois muitas pressuposições se revelam falsas e ilógicas quando confrontadas. Podemos até abrir mão de nossas pressuposições quando fazemos exercícios mentais numa discussão. O cristão pode raciocinar como um ateu a fim de fazer especulações filosóficas e científicas. A dúvida e o ceticismo metodológico tem espaço dentro da cosmovisão cristã.

No entanto, ninguém leva a vida real absoluta e consistentemente desse jeito. Nem mesmo os que fizeram tais objeções ao que escrevemos aqui. Todos partem de um ponto, um primeiro princípio, a fim de raciocinar e buscar o conhecimento. Ninguém faz "suspensão do juízo" completa e absolutamente, pois cairia num vórtice de irracionalidade.

Diante de questões cientificas teóricas, éticas e decisões que envolvam conceitos filosóficos, os críticos desse blog não praticam coerentemente o que pregam: jamais se permitiriam abrir mão totalmente de suas pressuposições.

Isso pode ser observado quando um psicólogo age como se livre arbítrio existisse de fato. Bem, para ser coerente com a sugestão dos relativistas, ele deveria tentar agir também como se o determinismo (genético, condicionamento) fosse verdade, o que traria uma confusão e comprometeria sua carreira. Na pratica, ele tem uma pressuposição (livre arbítrio e responsabilidade moral existem) e trabalha consistentemente sobre ela.

Os políticos deveriam abrir mão de suas convicções e tentar outras abordagens, até mesmo as mutuamente contraditórias. A crença em princípios como justiça individual e meritocracia poderia ser “suspensa” a fim de se experimentar as idéias de Hugo Chavez e Idi Amim. Mas na pratica, o político tem suas pressuposições e trabalha consistentemente sobre elas.

O pedagogo pode concordar com os relativistas e achar o discurso bonito, mas ele não matricularia seus filhos em qualquer instituição de ensino, sem se preocupar com a filosofia de educação e a abordagem pedagógica daquela escola. Na pratica, o pedagogo tem suas convicções sobre a natureza humana, a natureza da verdade e do conhecimento. Ele tem suas pressuposições e não fica “suspendendo o juízo” a cada inicio de ano letivo.

O professor de biologia pode definir o ser humano apenas como um animal membro da classificação Homo Sapiens, mas não age como se os seus alunos, ou seus próprios filhos, fossem apenas isso. Há pressuposições e convicções mais profundas envolvidas em teorias sociológicas, econômicas, psicológicas, etc.

A própria ciência assume que existe um universo organizado e inteligível, que os sentidos e a mente são confiáveis, que as inferências indutivas são legitimas, que a verdade existe e pode ser conhecida, etc. Essas pressuposições são assumidas, não-provadas, e ninguém “suspende o juízo” a cada vez que entra no laboratório ou na sala de aula.

O próprio relativista tem convicção de que o relativismo é legitimo, e faz suas objeções ao cristianismo baseado nas suas firmes pressuposições relativistas!

Portanto, o discurso relativista cai num poço de irrelevância tanto na vida pratica quanto no mundo estritamente racional. Então por que cristãos ainda insistem em aceitar passivamente as sugestões dos relativistas e até mesmo defende-las?

Todo mundo tem suas convicções e as defende sobre a plataforma de suas pressuposições. Só o cristão alienado é que não percebe que age como irracional ao se juntar ao coro dos céticos e relativistas "convictos" que sugerem a "suspensão do juízo" cristão enquanto mantem o seu próprio juízo intacto.

12 comentários:

  1. Vanessa, aqui está a diferença do que eu digo e do que você notou do que escrevi:
    você diz que ninguem faz suspensão do juízo completamente, mas eu jamais pedi que fosse feita por completo!
    Leia novamente a minha postagem. Lá está clara que no "humanamente possível".
    Este é o ponto. Enquanto puder fazê-lo, irei fazê-lo. E mais, com um objetivo claro de fazer num momento metodológico.
    Pois é, desde a publicação do artigo deixei claro que é dentro das nossas possibilidades. Por mais que seja pouca a suspensão de nossos juízos, isso permitiria cometermos alguns equívocos.

    Abraços,

    Arnaldo.

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  2. Ah e tem outra:
    na sua postagem você afirma que no cotidiano essa seria uma tarefa impossível de se fazer o tempo todo. mas eu não afirmei isto. afirmei que para investigar (daí o nome heurística usado no artigo) seria um método interessante, dentro de nossos limites.
    Mas parece que houve um erro interpretativo.

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  3. Arnaldo,

    "Leia novamente a minha postagem. Lá está clara que no "humanamente possível".
    Este é o ponto. "


    mas quem define o que é o "humanamente possível"? Eu, tu, o papa, o psicólogo, o violador,...?

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  4. Muito bem Arnaldo,
    gostaria de saber se é esse o teu discurso diante do naturalismo filosófico que rege com mão de ferro os meios acadêmicos e científicos.

    Gostaria de ver você defendendo a "suspensão do juízo" numa aula inaugural de ciências biológicas diante do alto clero evolucionista de uma universidade.

    Posso estar enganada, mas a tua proposta soa como a campanha do desarmamento: só desarma de um lado, enquanto outras facções da sociedade se armam mais e mais.

    A tua proposta é a "campanha do desarmamento filosófico". Ok. Peça pro Dawkins suspender o juízo e pensar como teísta criacionista. Peça para os filósofos relativistas suspenderem o juízo e tentarem uma abordagem cristã da filosofia nesse ano letivo. Acho que não né?

    Então, tu vens filosoficamente armado até os dentes propor que eu deponha minhas armas em nome da paz e do entendimento? Cristãos não tem espaço nos meios acadêmicos (a menos que suspendam o juízo). Vá discursar para os ditadores naturalistas.

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  5. Sobre a heurística, deixei claro nessa postagem (e em outras) que dúvida como método é saudável.
    O sujeito da ilustração do artigo não foi uma coincidência: é Tomé, aquele do "não acreditarei se eu não observar as marcas, tocar, etc".

    É uma pintura de Caravaggio.

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  6. Caros amigos,

    Concordo (e até discuti longamente sobre isso com amigos) que não podemos partir de um "ponto de neutralidade" para qualquer raciocínio (Plantinga). Se cristão, partindo dessa pressuposição. Se liberal, partindo da ausência de absolutos. A meu ver essa "suspensão de juízo" é falácia, algo hipócrita.

    Recordo-me que na nossa discussão levantamos a questão da unidade do conhecimento do homem natural (conhecimento filosófico) e do conhecimento salvífico (apreensão de Deus) ou "sensus divinitatis". Os filósofos em geral acreditam que unificam o conhecimento por si mesmos, eles se exaurem, a exemplo dos existencialistas (Sartre).

    Nós, cristãos, partindo desse pressuposicionalismo, acreditamos que jamais podemos unificar o conhecimento, já que isso só será possível por Deus, nunca à parte da revelação. Apreendemos Deus não pelo objeto em si (coisas criadas), mas, por assim dizer, pelo invólucro que carregamos, que nos é dado por Deus, corpo, alma e sentidos (intelecção).

    É isso. Citei essa discussão porque achei relevante.

    Em Cristo.

    Ricardo

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  7. Boa noite a todos,

    1) Olá Sabino? Primeiramente se ler nos meus ensaios que o humanamente possível será uma tarefa individual, e por isso subjetiva. Quando eu falo subjetiva, esqueça o clichê que a maioria de nós carrega na palavra. Imagine puramente como indivudual, sujeito. Isto não é o mesmo que "sem precisão". Essa heurística que proponho é simplesmente evitar que nossas tendencias nos influenciem, e para isso é uma espécie de constante autocrítica. Notou que está sendo tendencioso, partir a corrigir.
    Não nego que nós como humanos somos inspirados por "n" coisas ou que uma imparcialidade completa seja roboticamente possível; nao propus isto. Simplesmente quero propor que cada um de nós nos libertemos dos rótulos que não só nos nomeiam, mas também nos enjaulam em possibilidades restritas. Isso é uma tarefa individual e autocrítica.
    Entretanto noto que quanto mais falo sobre isso, mais provoco repulsa ou más interpretações sobre o que eu disse.
    De qualquer forma creio ter respondido sua questão: como tarefa individual, você tentará fazer essa suspensão até o ponto em que puder.
    Se eu argumentasse numa época em que não saberíamos a velocidade da luz: "a luz deve ter uma velocidade", estaria estipulando um limite ou padrão de velocidade à mesma. O fato de não sabê-la não é argumento contra a existência da mesma. Pense nisso.

    2)Agora: Ricardo eu não nego que uma imparcialidade hermética seja praticamente impossível. A nuance do que proponho é tentar evitar que nossas asserções pre-concebidas possam interferir numa dada investigação. Isso não é hipocrisia. Se notares a real significação disso e a sutileza que não estou impondo a ninguém a fazê-lo e também não estou propondo algo a "100%". Peço o que for possível a tí, tente fazê-lo. Esta heurística é aberta para interpretar a si mesma (como falei em meu artigo).
    Por isso não acho que a palavra hipocrisia seja a mais adequada.
    Ricardo, quanto a crença de que os "filosofos unificam" o conhecimento, acho que é uma informação que irá depender de qual filósofo estamos falando.

    3) Vanessa fico feliz de saber de sua parte que a dúvida metódica é sustentável, inclusive cristamente. Fico feliz pois o que defendi é no fim de tudo uma dúvida norteada por um método, o que chamei de método heurístico. Dúvidar por duvidar é tão insólito quanto afirmar por afirmar.
    Quando vi a figura da postagem, saquei que era Tomé (e pesquisando descobri que era de Caravaggio) e isso me suscitou até um pensamento interessante: lógico que pouco conheço sobre o âmbito bíblico e posso até estar falando uma besteira, mas ao analisar a atitude de São Tomé não creio que sua atitude, hoje em dia associada a um certo grau de ceticismo (dúvida), esteja errado. Não acho que tenha feito um erro ao apresentar tal indagação das chagas de cristo. Sustentou, ele, de alguma forma sua dúvida e depois de confrontá-la tomou certeza de sua fé. E isso não o faz menos crente em Cristo.

    Abraços,

    Arnaldo.

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  8. Olá Arnaldo,

    realmente o ceticismo metodológico é útil. É assim que aprendemos, que corrigimos falsas concepções, etc.

    O perigo reside em se "constranger" o conhecimento ao empirismo, como no caso de Tomé. Isso extinguiria o conhecimento, pois o empirismo e a confiança nos sentidos não abrange tudo o que se conhece ou que pode ser conhecido.

    Vou escrever algo sobre Tomé futuramente.
    Um abraço.

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  9. Ok, irei esperar sua escrita sobre Tomé.
    Agradaria-me saber um pouco mais sobre ele.

    Abraços,

    Arnaldo.

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  10. Romanos
    11:33 Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos!
    PRIMEIRO CORINTIOS-1-19-

    1:19 Porque está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, E aniquilarei a inteligência dos inteligentes.
    1:20 Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século? Porventura não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo?
    1:21 Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação.
    CONCIDERO SO A PALAVRA DE DEUS

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  11. Relendo tudo dei-me conta que faltou algo:
    a) quando afirmas:
    "A tua proposta é a 'campanha do desarmamento filosófico'. Ok. Peça pro Dawkins suspender o juízo e pensar como teísta criacionista. Peça para os filósofos relativistas suspenderem o juízo e tentarem uma abordagem cristã da filosofia nesse ano letivo. Acho que não né?
    Então, tu vens filosoficamente armado até os dentes propor que eu deponha minhas armas em nome da paz e do entendimento? Cristãos não tem espaço nos meios acadêmicos (a menos que suspendam o juízo). Vá discursar para os ditadores naturalistas."

    - Vanessa, a coisa é bem simples. Não estou propondo apenas para você. É para todos os interlocutores, independente de ideologia (isso ficou claríssimo nos meus artigos, basta ter o bom senso de lê-los com cuidado e interpretá-los adequadamente).
    Outra, não estou "armado até os dentes". Apenas fiz uma proposta que julgo ser válida. E essa proposta é para todos.
    Desculpe a retomada no assunto, mas percebi que este comentário havia passado despercebido e que necessitava ser esclarecido.

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  12. muito bom!! que Deus continue usando a sua vida de forma integral.

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