segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Se Jesus "Skandalizou"...

esse post é continuação de "Sequestraram o argumento do escândalo"

Skandalizo? - sim e não
A palavra grega para "escândalo" é skandalon - dentre outras coisas, ela significa "ofensa" e "ocasião para cair". Jesus advertiu: "ai do homem pelo qual vem o escândalo!" (Mt 18:7)
Somos biblicamente orientados a não escandalizar nossos irmãos (Rm 14:13; 1 Co 8:13).
As palavras de Pedro "nunca Senhor, isso nunca te acontecerá" foram skandalon para Jesus (Mt 16:22-23).

No entanto, o próprio Evangelho de Cristo é comparado a uma "rocha de escândalo". (Rm 9:33)
A mensagem da Cruz é "escândalo para os judeus" (1 Co 1:23; Gl 5:11)
Jesus é skandalon (1 Pe 2:8).

O verbo grego para "escandalizar" é skandalizo - dentre outras coisas, significa "ofender".
Felizes são os que não se escandalizam (não se ofendem) por causa de Jesus (Mt 11:6)
A semente que cai em terreno pedregoso não prospera porque a pessoa vai se escandalizando até abandonar (Mt 13:21).

As pessoas ficavam escandalizadas por causa de Jesus (Mt 13:57).
Ao questionar suas tradições, Jesus escandalizou os fariseus (Mt 15:12).
O discurso de Jesus escandalizava seus próprios discípulos (Jo 6:61)
Por outro lado, numa ocasião Jesus não quis escandalizar ninguém e pagou o imposto do templo. (Mt 17:27)
Um dos sinais dos tempos é que "muitos ficarão escandalizados" (Mt 24:10)

Fica claro que Jesus evitou o escândalo numa questão inferior, mas provocou o escândalo quando princípios bíblicos estavam sendo desafiados pela tradição. Então a questão não é tão simples a ponto de ser resolvida com um genérico "não escandalize!" diante de qualquer situação. Existem situações que exigem um bom escândalo bíblico.

O fraco se escandaliza - Rm 14
Esse é um problema parecido com o das “carnes sacrificadas a ídolos”, que Paulo enfrentou nas cartas aos Romanos (provavelmente) e aos Coríntios. Não havia nada de errado com a carne em si, o problema era a conotação pagã, a “associação de imagens” que escandalizava algumas pessoas. Alguns consideravam que comer essas carnes era aceitar e praticar a idolatria (realmente, Salomão tinha razão em dizer que “não há nada de novo debaixo do sol”).

O conselho de Paulo ainda é válido para hoje: quando algo é moralmente indiferente, deve ser julgado pelo seu efeito em nossa consciência, na consciência dos outros (não devemos ser causa de tropeço) e principalmente na glória do nome do Senhor entre os incrédulos. O importante é ter conhecimento e firme convicção naquilo que se faz, caso contrário, incorremos em pecado.

Paulo menciona, em Romanos 14, o cristão que é fraco, ou seja, que ainda não amadureceu espiritualmente e possui uma consciência cheia de escrúpulos exagerados. Mas não se pode ir ao outro extremo, confundindo a consciência forte com a consciência cauterizada, sem nenhum critério. De acordo com a Bíblia, é errado violar a consciência de alguém em assuntos moralmente indiferentes, principalmente se for de um fraco na fé. Portanto, é necessário considerar a responsabilidade que todos temos de manter intocada a débil consciência dos fracos, para que ninguém seja levado a escandalizar-se desnecessariamente.

O Comentario Bíblico Adventista esclarece quem é o fraco do texto de Rm 14:1:

"É alguém que tem apenas uma compreensão limitada dos princípios de retidão. Ele quer ser salvo e está disposto a fazer qualquer coisa que acredita ser-lhe exigido; mas devido a imaturidade de sua experiência cristã (cf Hb 5:11 a 6:2), e talvez também como resultado de sua educação anterior e de suas crenças, trata de garantir sua salvação por meio da observância de certas regras e prescrições que na realidade não são obrigatórias para ele. Dá muita importância a essas regras; as considera como absolutamente vigentes para poder alcançar a salvação, e está angustiado e perplexo quando vê que outros cristãos que conhece, especialmente os que parecem ter mais experiência, não compartilham seus pontos de vista."

Perfeito.

Eu destaco apenas o fenômeno observado no primeiro post: ao contrário do descrito no parágrafo acima, alguns fracos na igreja de hoje já estão há décadas na experiência cristã. Alguns até nasceram em lar cristão de terceira ou quarta geração. Os "não-me-toques" legalistas foram passados de pai para filho e ninguém ousou confrontar as vacas sagradas desse pessoal e gritar "o Rei está nú!"

Repare que o texto aconselha a aceitar o fraco e não ficar discutindo com ele. Mas em parte alguma o texto orienta o fraco a continuar incomodando os demais com suas manias e costumes. Creio que nesse post eu estou no limite de desobedecer o conselho de Paulo no verso 3 ("não menospreze"), mas o conselho de Paulo para o hiper-escrupuloso é "não julgue". Então proponho um acordo: não menosprezarei e ninguém me julgará. E nos assuntos em que eu tiver minhas próprias manias desafiadas farei de tudo para não julgar ninguém ou usar minhas manias como régua espiritual.

E o detalhe final: a ordem "não escandalize"(v. 13) é dada a fortes e fracos. O argumento do escândalo não é unilateral. Portanto, paremos com essa chantagem bíblico-emocional e libertemos o argumento do escândalo do cativeiro da frescura-de-crente.

Chegou a hora de crescer
Concluo afirmando que o fraco não pode continuar sendo fraco para sempre. A obrigação de todo cristão é conhecer a vontade de Deus através da Bíblia (II Tm.2:15), crescendo cada dia mais (Pv.4:18), até chegar a um nível de amadurecimento próximo ao de Cristo (Ef.4:13). No Antigo Testamento, Deus exigia expiação pelos pecados cometidos na ignorância (Levíticos 4). Isso revela que a ignorância não é uma desculpa aceitável para a estagnação espiritual ou para a quebra da Lei quando os fracos são devidamente notificados de seus erros (Lv.4:23).

O que não pode acontecer é que sob a desculpa de que “não devemos escandalizar”, a liberdade cristã seja diminuída e eu tenha agora que me curvar diante de cada mania que eu encontrar na igreja. Se fossem poucas manias eu até cooperaria, mas elas se multiplicaram muito, e eu tenho mais o que fazer (além de já ter que lidar com as minha próprias manias).

Viver fiscalizando a todo momento as minúcias comportamentais e os detalhes secundários é extremamente desagradável. O “argumento do escândalo” não deve servir às chantagens e ameaças, e muito menos à imposição de pesados jugos sobre os que já superaram certos escrúpulos não-bíblicos e retiraram de suas manias particulares o indevido rótulo do "assim diz o Senhor".

Para um estudo detido sobre coisas moralmente indiferentes, examinem-se os textos de: Rm.14; I Co.10:23-33; I Tm.4:4; Cl.3:12-17 e 23; Tt.1:15.


“Bem aventurado aquele que não se condena naquilo que aprova” (Rom.14:22)

4 comentários:

  1. Até certo ponto estava concordando com estudo profundo que você nos trouxe, infelizmente comecei a discordar no "unilateral".

    Deus não nos pede coisas segundo o que o outro nos faz, mas é incondicional nossa prática.

    Não podemos forçar ninguém crescer, mesmo que os outros nos forcem.

    Jesus escandalizou para salvar, não fora por meras discussões ou pontos de vista.

    O que precisamos é de sabedoria para sabermos quando falar e quando calar.

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  2. Olá João Batista,
    Acho que não entendi onde exatamente está sua discordância.

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  3. "chantagem bíblico-emocional"...

    Meu, tu usa uns termos mto perfeitos!

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  4. Oi Vanessinha, acho muito bom mesmo o conteudo do seu blog. Ah se os blogs de vários pastores por ai, bem mais reconhecidos, tivesse tal nivel e originalidade.

    Bem, contudo faço aqui um comentário a respeito do "Comentário Adventista", considerado "perfeito" por ti.

    Diz: "trata de garantir sua salvação por meio da observância de certas regras e prescrições que na realidade não são obrigatórias para ele"

    o texto talvez fosse perfeito, realmente, se não fosse por esse trecho no qual ele diz "não são obrigatórias para ele". Dando a impressão de algo dispensável. Porém, que virtude é dispensavel ao cristão? Então não seria virtude.

    Na verdade a pessoa perdeu o foco e o impacto de suas próprias idéias ao escrever isso. Pois veja bem, no inicio ele já diz: "compreensão limitada".

    Logo, o problema não é a "obrigatoriedade" da coisa. Mas sim a compreensão da coisa. Uma visão limitada é não compreender a essência da coisa; logo, não se compreende como varia essa função.

    E sim, essa função, é uma obrigatoriedade sim para o cristão, pois significa em essência a vontade de Deus. O problema, é quando se considera tal, como uma função constante, ao invés de variável; e então, conhecer sua fórmula.


    Abraços.

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