domingo, 18 de abril de 2010

O poder do amor

A avaliação do centurião romano de que aquela Vítima da maior injustiça humana, exausta, suja, maltratada, era e é o próprio Filho de Deus pode não ser uma conclusão provável, mas é a conclusão à qual a fé cristã se dirige à despeito de todas as aparências. É uma conclusão que nos obriga a reconsiderar o modo como estamos acostumados a pensar em Deus. Agregamos naturalmente à Deus imagens de poder, glória, esplendor e majestade irrestritos, o tipo de poder que associamos aos senhores feudais e suseranos. É um tipo de poder que deixa pouco espaço para a vulnerabilidade, o sofrimento, a fraqueza ou o sentimento divino.

Convido você a ler o subversivo (e em certos versos, blasfemo) poema “High and Lifted Up” (Elevado e Exaltado), de Studdert Kennedy, e redescobrir que tipo de poder define o “poder de Deus”.

Sentado no trono do poder, com o cetro em tuas mãos
Enquanto a multidão de anjos se posta para te servir.
Foi assim que o profeta te viu, em arrebatamento,
Enquanto o som de muitas águas ondulava no ar como música,
Ondulava até explodir como trovão num brado de perfeito louvor
“Santo, santo, santo Pai, teu é o domínio pelos séculos dos séculos.
Teu é o reino, tua é a glória, teu é o esplendor do sol,
Tua é a sabedoria, tua é a honra, tua é a coroa da vitória conquistada”.

Foi assim que o profeta te viu, assim este artista também te viu,
Dá colorido à sua visão, mistério de ouro e azul.
Mas permaneço ali aflito e maravilhado; meu Deus, meu Deus, não posso ver,
Trevas profundas e mais profundas trevas – o mundo inteiro está sombrio.
Onde está o poder? Onde está a glória? Onde está a vitória conquistada?
Onde está a sabedoria? Onde está a honra e o esplendor do sol?

Deus, odeio esta esplêndida visão – todo seu esplendor parece mentira,
Tolos ilustres vêem tolices grandiosas, esplêndida miragem nascida para morrer.
Como águas imaginárias para um sedento agonizante,
Como a visão de um banquete para um corpo castigado pela fome,
Como um anestésico para o soldado louco de dor,
Enquanto seu corpo dilacerado e torturado se agita, se torce e se contorce,
Esta esplêndida visão enganadora se agita em meu coração descrente,
Como uma baioneta enferrujada na ferida aberta.

Pregadores tentam me confortar, e eu os amaldiçôo por sua coragem,
Tagarelices mesquinhas e fúteis de poder e graça; de poder e sabedoria ilimitada
Que cuida das pequenas aves, veneno açucarado e sentimental
Num caldo de palavras enjoativas.
Mediocremente piedosos, ultrapassando todas as dúvidas e medos,
Eles falam da misericórdia do Deus que seca lágrimas.
Seu discurso é afogado em soluços, e ouço o grande gemido do mundo,
Enquanto vejo milhões de mães chorando sozinhas,
Vejo uma multidão de donzelas inglesas queimando em fogueiras,
Enquanto uma multidão de corpos ainda estremece no arame farpado alemão.

E odeio o Deus do poder em seu trono celeste e infernal,
Olhando o estupro e o assassinato, ouvindo o gemido das crianças.
Embora um milhão de anjos o saúdem “rei dos reis”, eu não posso saudá-lo.
Nada que possa quebrar o silêncio da minha dor segura o grito:

“Tu que governas este mundo de pecadores com tua pesada vara de ferro,
Existiu algum pecador que pecou o pecado de Deus?
Houve algum vilão que ficaria olhando o vândalo empurrar a baioneta
Nas entranhas de um bebê só por diversão?
Louve a deus nos mais altos céus, em todas as alturas seja louvado,
Aquele que em todas as suas obras é feroz, como um animal em seus caminhos”.

Deus, o Deus que amo e cultuo, reina na aflição do madeiro,
Alquebrado, sangrando, mas indomado, o verdadeiro Deus de Deus para mim.

Toda a pompa ostensiva de esplendor, todas as asas de anjos resplandecentes
Foram emprestadas das bugingangas que rodeiam os reis terrenos.
Numa manjedoura, num chalé, num barraco de um trabalhador honesto,
Nos lares de camponeses humildes e na vida simples deles,
Na vida de um proscrito e de um vagabundo na terra,
Nas coisas comuns que ele valorizou e declarou de valor inestimável,
E acima de tudo no horror de sua morte cruel,
Num criminoso crucificado tu nos convidas a procurar tua glória.

E nós a encontramos – porque a tua glória é a glória da perda do amor
E não tens nenhum outro esplendor senão o esplendor da cruz.
Pois em Cristo eu vejo os mártires e a beleza de sua dor,
E nele ouço a promessa de que na morte serei ressuscitado.

Elevado e exaltado, eu o vejo no eterno Calvário,
E duas mãos traspassadas estendidas para leste e oeste, sobre terra e mar
Caio de joelhos e louvo pela grande cruz que reluz nas alturas,
Porque o verdadeiro Deus dos céus não é só poder,
mas é o poder do amor.


Resumido em (linda a progressão a partir de 2:20...):

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